sexta-feira, 17 de agosto de 2007

O desespero de causa das acções

Corro mais depressa para que o tempo passe mais depressa (...) ainda mais depressa e sei que, por causa disso, as pessoas envelhecem mais depressa, morrem, nascem crianças. (...) E corro o mais depressa que consigo, como se fugisse daquilo que me assusta, como se fosse possível fugir daquilo que levo no interior da minha pele e vai comigo para todos os lugares, corro o mais depressa que consigo, como se pudesse deixar-me para trás, como se pudesse correr tão depressa que, num momento, me soltasse de mim e me deixasse a mim próprio para trás, como se avançasse para fora do meu corpo e, através da velocidade, me purificasse, corro o mais depressa que consigo, corro.


José Luís Peixoto, Cemitério de Pianos

domingo, 5 de agosto de 2007

O meu amor no teu coração

Hoje estou aqui. Não importa, é certo, onde estou. Na verdade, só não queria ser. Quem me dera conseguir deixar de ser! Sair de mim. Desaparecer se preciso fosse, sem me levar comigo.
Não estou farta de mim. Mas trago-te tanto em mim que chega a doer ser eu.
É esse sorriso que nunca deixo de ver, mesmo com os olhos fechados. É essa voz que nunca deixo de ouvir, mesmo quando estou a dormir. São esses braços que tanto me apertaram em aconchegos de felicidade, cuja força teima em persistir nestes pedaços de solidão. São essas mãos que tanto por mim e nas minhas passearam, que ainda lhes sinto a forma. É esse corpo que tanto me aqueceu, que tão bem soube ver e sentir, que ainda me abraça quando faço muita muita força, e consigo o que quero no breve instante do limiar da insanidade, no ponto quase sem retorno da loucura.
Não estou bem em lugar nenhum. O meu corpo mexe, nunca desiste de me levar, de me tirar de onde estou, mas a cabeça e o coração estagnaram em ti, e daí não saem. Onde quer que vá, tu vais comigo. Mas não estás lá. E volta a doer. Nada me distrai, nada me tira deste aperto, deste sufoco, desta paixão asfixiante que ainda assim quero sentir. Que mesmo que não quisesse, ela aqui ficou, do tempo em que, sem medos, a podia desenrolar perante ti e todos. Desta vontade de ser tua, e tu comigo, sermos só nós.
Sabes uma coisa? Gosto de ti.
As saudades dilaceram-me. A minha impotência para te fazer ver e crer que estou aqui para ti, que jamais te deixarei cair, que nunca te derrubarei, que serei alcofa dos teus sonhos e recanto do teu prazer, rasga-me o ser, modelando este autómato que vai para onde o levam porque nada mais importa.
E sabes que mais? Gosto de ti. Tanto, que já inventei uma medida só para ti. Que o muito há já muito que é pouco...



Porque o que eu mais quero é fazer-te feliz... E estar contigo, inventando paraísos na Terra! Porque só contigo, e para ti, sou capaz disso... E só isto me chega...