quarta-feira, 1 de julho de 2009

AA

Acordou feliz. Ora então porque não haveria, estavam na calha os 30 dias de sobriedade.
Nos primeiros dias, até as horas, até os minutos se contam, que o tempo é lento no passo, custa, arrasta-se, é preciso a gente dar-lhe força, "vá, tu consegues", um minuto agora, um minuto depois, não tarda está uma hora passada, não há-de tardar e chega a noite, e com a almofada como rede de segurança, vai ser vê-lo correr desenfreado!
O fim da primeira semana chegou, e apesar de tudo, confessa agora para si mesma com um certo espanto, calmamente. Mais uma e outra, e já havia no ego um roçar em jeito de mimo, que só a sensação de dever cumprido, de objectivo atingido dá, e daí a nada já se faz a contagem decrescente para o mês, "que espectáculo!, nunca pensei aguentar", essa fasquia lá no alto, que tanto exige quanto sabe bem.

Um dia no início encerra nele muitas coisas. Tantas, que nem nos passam pela cabeça. O que à primeira vista é corriqueiro, é só mais um, é "normal", vai não vai e dá mil voltas e mais uma e nós nem nos apercebemos como aconteceu: quando damos conta, já é em cima do acontecimento. Já é tarde. Não é que devamos andar sempre desconfiados, a perscrutar becos e ruelas por ocasiões a espreitar com embustes prontos a ser lançados, com tropeços desta ou daquela vida que se vão interligando ou, simplesmente, cruzando com a nossa, com tempos por passar e vontades por cumprir. Mas o mal, é que tiramos muito peso à unicidade dos dias, e com a leveza vem a banalidade, esse que é o primeiro passo para sermos apanhados de surpresa, em jeito de calças para baixo, sem hipótese de correr.
Esse que só estava para ser lembrado no final, porque já tinha passado, porque só se festeja no fim, depois de acontecer, foi conduzido sinistramente por cordelinhos invisíveis mas intrincados, avassalado por uma força bruta como quem leva com um camião contra o peito.
O problema nem teve na fraca visibilidade, isso nem se verificou, que a rua de onde surgiu era larga e recta, sem perpendiculares matreiras. Devia estar a contar com isso, mas de cada vez que o equacionava, sentia-o tão distante em termos de possibilidade, que varria-o logo da ideia "eu estou mas é a divagar!" E com essa auto-confiança tão facilmente abalável como bandeira e escudo, cedeu, caiu, deixou-se apanhar, e se ao menos tivesse gozado da sensação ébria do momento, ainda todo o joelho esmurrado e nariz partido teriam sido para alguma coisa, algum proveito. Mas dali só tirou a possível e dedutível ressaca dolorosa, merecida no fim de contas, que lhe valeu um chicotear auto-flagelante, um "bolas, não valho mesmo nada, tinha-me em melhor consideração", um ir abaixo e na descida, um deitar fora da força acumulada até então.

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